Fundo Socioambiental Conexsus ajudou a CPC e a Cooperipe a resolverem problemas que impediam as cooperativas de acessarem o crédito rural mais adequado
Crédito adequado fortalece os negócios comunitários e permite que eles cresçam. Mas muitos não conseguem acessar as opções com menor taxa de juros por falta de garantias ou por terem dívidas. A história de duas cooperativas apoiadas pela Conexsus mostra que são problemas fáceis de resolver, mas há poucas opções adaptadas ao perfil e necessidades desses negócios.
Dois pequenos empréstimos do Fundo Socioambiental Conexsus possibilitaram à Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Espírito Santo e à Cooperativa dos Agricultores Familiares de Ipê do Rio Grande do Sul resolveram as pendências que as impediam de acessar o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).
“Um dos nossos focos é dar apoio técnico e monetário para que os negócios comunitários superem as dificuldades de acesso a linhas de crédito que lhe são mais favoráveis”, explica Carina Pimenta, diretora executiva da Conexsus. “A história da CPC e da Cooperipe é uma mostra de que instrumentos inovadores podem fazer uma grande diferença para a sustentabilidade financeira desses negócios”.
No fim de junho, a CPC-ES comemorou a lavra em cartório da escritura do imóvel. O documento é a peça que falta para a cooperativa poder oferecer garantia na contratação de crédito do Pronaf. Eles planejam usar o recurso do Pronaf para liquidar uma dívida de aproximadamente R$ 200 mil em crédito rotativo contraído nos bancos em 2018, com taxa de juros de 2,3% ao mês. Para se ter uma ideia, a taxa anual do Pronaf Cotas-Partes, voltado a capital de giro, custeio, investimento e saneamento financeiro de cooperativas, não passa de 5%.
“Resolvendo essa questão da dívida, poderemos canalizar nossas energias para acompanhar a produção de nossos cooperados, buscar novos mercados, cuidar do marketing dos produtos e do nosso projeto de transição agroecológica”, diz Dorizete Cosme, presidente da CPC-ES.
A situação financeira da CPC-ES agravou-se com o cancelamento de contratos de fornecimento de hortifrutigranjeiros a prefeituras capixabas. Esses contratos eram pagos com recursos do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que tiveram seus orçamentos severamente enxugados pelo governo federal desde 2016.
O custos com lavra e registro do imóvel estão sendo cobertos por um empréstimo de R$ 18 mil concedido pelo Fundo Socioambiental Conexsus. O aporte foi apenas um dos inúmeros desdobramentos da parceria estabelecida com a Conexsus a partir da Jornada de Aceleração, realizada em 2019.
“A Jornada foi um divisor de águas para a cooperativa. Neste tempo de tantas crises, não sei se estaríamos com nossa cooperativa funcionando, não fossem os conteúdos e apresentações da Jornada”, assinala Cosme. Graças às oficinas da Jornada e às mentorias online ministradas pelas equipes da Conexsus e da Semente Negócios, os dirigentes da CPC se deram conta da importância de profissionalizar a gestão financeira e operacional da entidade e priorizar a busca de novos mercados que paguem preços mais justos aos cooperados.
Uma das dificuldades da CPC-ES trabalhadas na Jornada foi a definição de preços para seus produtos. Os representantes da cooperativa na iniciativa da Conexsus tinham a impressão de que a baixa procura pela Cachaça Crioula, produto artesanal derivado de cana-de-açúcar cultivada com métodos agroecológicos, decorria de um preço supostamente elevado.
Luciana da Costa Brandão, consultora de inovação social da Semente Negócios, conta que propôs um teste simples de mercado a Dorizete Cosme e Douglas Alvaristo, superintendente da CPC-ES: oferecer a cachaça por preços mais altos em alguns portais de comércio eletrônico.
Para a surpresa dos dirigentes da cooperativa, a demanda pelo produto foi positiva. Ficou a lição de que o mercado para um produto diferenciado, como a Crioula, deve ser buscado em segmentos de consumidores com interesse e conhecimento sobre esse tipo de mercadoria.
“A venda de um produto precisa ser preparada por meio do mapeamento do mercado, identificação do público-alvo, de metas, métricas, uma proposta de valor e testes de mercado simples e baratos”, recomenda Luciana.
Uma investigação de fraude no leite em 2017 teve severo impacto na Cooperativa dos Agricultores Familiares de Ipê (Cooperipê), que não estava entre os investigados. Famosa na época, a Operação Leite Compensado do Ministério Público do Rio Grande do Sul investigou dezenas de indústrias e entrepostos de resfriamento por adulterarem os produtos.
A Cooperipê fornecia para algumas delas, que interromperam abruptamente os pagamentos. De uma hora para outra, a cooperativa ficou sem capital de giro para remunerar os cooperados pela entrega do leite.
Com o intuito de pagar os produtores o quanto antes, a Cooperipê recorreu a empréstimos a juros de mercado no Banrisul, Cresol e Sicredi, oscilando entre 1,7% e 2,36% ao mês.
“Em 2019, a cooperativa pagou R$ 360 mil aos bancos, sendo R$ 130 mil apenas de juros”, conta Ivanor Provin, gerente comercial da Cooperipê. “A dívida estava nos estrangulando, não conseguíamos respirar.”
Entretanto, a cooperativa decidiu priorizar o pagamento dos empréstimos, de maneira a evitar uma deterioração mais grave de sua condição financeira. Dessa forma, a entidade acabou ficando inadimplente com fornecedores, situação que trouxe restrições a seu CNPJ, obstáculo à contratação de crédito do Pronaf.
O problema só foi resolvido com um pequeno aporte de R$ 35 mil do Fundo Socioambiental Conexsus. Embora modesto para uma cooperativa que faturou R$ 2,8 milhões no ano passado, o crédito foi suficiente para a cooperativa liquidar dívidas com fornecedores e remover as restrições ao CNPJ.
Sem a pendência, a Cooperipê conseguiu contratar em abril R$ 400 mil em crédito do Pronaf Cotas-Partes, que tem juros de 4,6% ao ano. O empréstimo foi utilizado na liquidação do saldo devedor dos empréstimos contraídos em 2017.
Foram diretores da Cooperativa Central de Comercialização da Agricultura Familiar de Economia Solidária (Cecafes) que aconselharam seus colegas da Cooperipê a procurar a Conexsus para discutir soluções para seu imbróglio financeiro.
Além do empréstimo concedido à cooperativa para o pagamento de fornecedores, a equipe da Conexsus e o consultor José Miguel Pretto, especialista em cooperativismo, prestaram assessoria à Cooperipê do início ao fim das negociações com a Cresol para a aprovação do Pronaf Cotas-Partes.
Augustinho Lorenzzetti, gerente comercial do posto de atendimento da Cresol em Ipê, que aprovou a contratação do Pronaf Cotas-Partes pela Cooperipê, recomenda às cooperativas que evitem recorrer a crédito com juros de mercado. “Não adianta só emprestar dinheiro às cooperativas. É necessário oferecer atividades de educação financeira à diretoria dessas organizações.”
É justamente por isso que a Conexsus tem um Núcleo de Mentoria que oferece aos negócios comunitários um acompanhamento com foco na gestão administrativo-financeira. Com a pandemia, o trabalho foi intensificado neste ano. Toda organização beneficiada pela Linha Emergencial tem um plano de ação para adoção de boas práticas na gestão, com acompanhamento da Conexsus.